AS VIAS ABERTAS DA ANTÔNIO CARLOS.
Marina da Silva.
Não é a primeira vez que a Avenida Antônio Carlos, que liga o centro de Belo Horizonte a Pampulha e zona Norte tem suas vias expostas aos homens e máquinas.
A exposição mais recente é de 2004, data do início da atual duplicação de 3.9km, que após cinco anos (e duas recapeadas) ainda se encontra na segunda etapa. Uma verdadeira empreitada que chega a superar até mesmo os Doze Trabalhos de Hércules!
Uma empreitada de primeira para empresas que no Brasil sempre fazem obras de quinta lançando mão de terceiras.
Além de fazer vista, a obra deu o que falar pelo trabalho de um artista! Preocupados com a ocupação irregular, os túneis foram enfeitados com muito concreto e um obra no mínimo surrealista: um bode dragão com chifres e barbicha num gordo corpo de Buda deu serviço para vereadores exorcistas! A arte não só cumpriu o seu papel – espantar sem tetos e mendigos - como quase sacrificou a reeleição de Pimentel. Então...
Com mais uma tonelada de concreto abateu-se o monstro de vez e pôs fim a saga televisiva. Prestígio igual nem o capeta do Vilarinho, outra lenda daqui.
Em 2008 a obra que era pavê, ou seja, só pra olhar, começou a ser consumida deixando a vista buracos, calombos e em muitos pontos um craquelê! Recapear! Foi a solução para uma lâmina de asfalto tão fina de fazer inveja a uma gilete. A segunda etapa começou quando Aécio, o governador, sentindo o desânimo de Serra (o líder nas pesquisas para presidente) com o fortalecimento de Dilma Roussef , resolveu se lançar candidato a presidência da república. Da noite para o dia, quase meados de 2009 choveu homens e máquinas na pista pondo abaixo – do hospital Belo Horizonte à praça dos peixes ali ao lado da rodoviária, casas velhas, prédios antigos, barracos e galpões. O trecho virou um campo de guerra e quase nada das antigas construções ficou de pé: botecos copos sujos, puteiros, casa de exorcismo e orações, igrejas evangélicas, jogo do bicho, galpão de obras sociais, o antigo cinema, o posto policial, o Leguedê das roupas velhas!
Por um triz salvou-se o Hospital Belo Horizonte, o hospital Municipal Odilon Behrens, a antiga escola Municipal, o Mercado, a Polícia Civil e o lendário conjunto habitacional IAPI.
Limpeza geral e saneamento urbano acabou por deixar ao desabrigo dezenas de indivíduos que viviam por ali: mendigos, moradores de rua, os sem teto, os muitos filhos do narcotráfico e sua cracolândia.
Uma pobreza e miséria imensa, incomensurável estão agora na superfície, escorrendo pelas artérias e veias abertas da nova via, testando e reinventando novos abrigos aqui ou ali, deixando exposto em carne via um descaso e descompromisso social que se escondia nos muitos quilômetros da avenida.
Hoje estão a olhos vistos, toda a miséria e indignidade em que vivem dezenas de pessoas que sobreviviam camuflados e escondidos nos lotes vazios, prédios velhos e construções abandonadas da Antônio Carlos. Um horizonte não tão belo da Belo Horizonte, uma das cidades mais importantes do país, capital de um estado riquíssimo que cresce a cada ano por mais de uma dezena de anos batendo os números de crescimento econômico do Brasil!
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